Não há muito tempo, vi um grupo de gente adulta a cair em cima da moderadora
da principal instância Mastodon portuguesa, e o que vi não foi nada bonito.

Queriam, na sua animada entrada pelo fediverso adentro, discutir efusivamente o
tema do dia. Perderam as estribeiras quando lhes foi indicado que o Mastodon
não funcionava tal qual o Twitter, e havia umas coisinhas como CWs e hashtags e
se querem dizer palavrões ok mas há limites, e umas cenas que se pudéssemos só
ter no sítio era top.

Indignaram-se com a forma. Os pedidos estavam incorrectamente formulados, e a
adjectivação foi expansiva. Pouco agradável e pouco profissional. Tóxica.
Incompetente. Musk da aldeia. Moderação inquinada. Atitude pidesca e moralista.
Tiranete do caralho. Conas de sabão. [tudo sic]

Por entre os variados floreios dirigidos à atónita moderadora, surgiram
comparações com o Diácono Remédios. Uma, duas, três, várias. Alguém sentiu a
necessidade de ir descrever ardentemente o episódio para o seu Instagram.

Porque ela não pediu com jeitinho ao pessoal que entrou pela casa adentro, que
pôs os pés nas mesas e desatou a fumar e a falar alto. Não soube empregar o tom
adequado à sensibilidade destes ilustres colonos, alguns dos quais soltam caralhadas
a cada 5ª palavra e os seus amigos batem palmas; mas olha agora a impertinência da
miúda.

O protesto dominante foi que essas exigentes regras da casa não estavam
devidamente afixadas (e as que estavam, o mal era estar mal explicado).
O problema, portanto, era o desaforo de protestar quando a casa não tem uma
placa a dizer que não se pode fumar, outra para respeitar o volume do discurso
existente, e ainda outra a indicar os locais aceitáveis para colocar as solas
dos sapatos – não sei se a vossa casa tem, mas a minha não tem nenhuma dessas
placas e ai de quem fume e mande vir.

Mas onde é que estão as regras? Não explicam querem o quê? Claro que vamos
esbardajar isto tudo, porque se não há regras a dizer que não posso cuspir no
chão vou já cuspir no chão, vocês merecem pela vossa insolência e também por
não permitir QTs à malta fixe que não quer nada mais nada menos do que a
experiência que já tinha no Twitter. CWs? Cala-te e traz-nos mas é uns gin tónicos,
ó Diácono.

E agora que já houve toots e subtoots suficientes para ficar bem colado o
estereótipo do irritante velho moralista, vamo-nos rir todos. Olha lol vou
tb meter no meu Instagram para o ppl kurtir o ridíkulo desta gaja.

E foi desanimador ver reivindicações de liberdade de expressão seguidas de
mandar calar o outro. Também se defendeu que o problema era que a moderadora
não estava familiarizada com o “estilo de intervenção” deste grupo, e que não se
deve julgar os livros pela capa.

Uns dias depois, voltei a lembrar-me do Diácono Remédios, mas desta vez na sua
desagradável característica de entrar pelo sketch adentro, sem perguntar se era
preciso tirar os sapatos, a dominar subitamente a cena com a sua voz alta,
perante personagens a quem só restava levar com o raspanete devido a
desaforos vários e arbitrários.

E encanta-me realmente, de um ponto de vista antropológico, como vi gente
feita, progressista até, a sair-se com essa do Diácono para pontuar este particular
“estilo de intervenção”.


Toda a gente que põe o pé no fediverso tem a porta aberta nas várias instâncias
disponíveis para os acolher. Há a cortesia elementar que se pode esperar tanto de quem
chega como de quem recebe, e as lacunas nos processos devem ser assinaladas para
que o saldo do episódio seja apenas tudo ficar melhor para todos.

Mas qualquer que seja o pretexto invocado, perturbou-me testemunhar tanto
conforto em importunar de tal forma uma pessoa. No fediverso ou em qualquer
lado, não está bem.

O propósito deste texto é levantar um ponto de vista sobre este pequeno (mas
relevante) incidente que não vi suficientemente expresso. Aproveito para
mandar um agradecimento para quem se insurgiu contra este dogpiling, também vos
vi. Não me meti agora ao teclado para apontar dedos, exigir desculpas ou
recomendar condutas; todos os envolvidos são adultos que parecem ter os meios
para tirar as devidas conclusões, que são lá com eles. Não faço menções de
nomes porque quero evitar o potencial mal-entendido de demonstrar interesse em
interagir com os envolvidos no que toca a este episódio, e faço questão de me
focar na conduta e não nas pessoas.

É tudo o que tenho a dizer. Gosto de ser cirúrgico no tempo que dedico a
dramas, e não tenciono prolongar nem permanecer na discussão deste episódio.
Há aqui uma instância para acabar de montar e outros afazeres construtivos à
espera.