Do investimento da Microsoft em Sines
Talvez alguém me consiga explicar melhor esta "novidade anunciada" do "investimento da Microsoft em Portugal". Porque para mim nem parece uma coisa nova, nem um investimento em Portugal - mas revela outras coisas... É que isto é na realidade um acordo entre a Microsoft (US) e NScale (UK) para alojar servidores Dell (US) com gráficas NVidia (US) em datacenters nos Estados Unidos e na Europa - já anunciado no mês passado. Um desses datacenters Europeus será o de Sines, em Portugal, onde esses "servidores para AI" irão estar a sugar energia (e sim, aposto que isso irá gerar receita para a Start Campus, ainda que não vão ser os tais dez mil milhões - e apesar da Start Campus ser detida por fundos US+UK, sempre mantém postos de trabalho em Portugal...).
Mas se isto já me pareceria "pouco para celebrar" (lá está, talvez me esteja a escapar qualquer coisa), o que me aflige é a parte de que ninguém está a falar - uma AI farm em Portugal para quê? E a resposta também já nos foi dada no anúncio do mês passado, e devia-nos preocupar: o objectivo da Microsoft é ter como "providenciar a clientes Europeias soluções de IA soberana, dentro da Europa" - ou seja, todo este investimento da Microsoft é para a Microsoft tentar vender na europa as suas soluções de "Microsoft Sovereign Cloud" que, como sabemos, de soberanas não têm nada.
É possível que eu não esteja a ver bem a coisa - e haja aqui uma dimensão, talvez até óbvia, que me esteja a passar ao lado. Mas mesmo que assim seja, este papaguear de uma "boa notícia" sem explicar a notícia ou porque é boa pouco abona do jornalismo que tem coberto este re-anúncio.
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O manifesto das cebolas na era da transição digital
Ocorre-me com regularidade que eu escrevo demasidos comentários em redes sociais efémeras por natureza, ideais que rapidamente se perdem em eternos scrolls. Este é um texto que escrevi numa thread no twitter e que agora republico aqui, para mais fácil guardar para a posteridade.
Em 2012, a ANSOL - Associação Nacional para o Software Livre, lançou o seu manifesto do campo das cebolas. Aí criticava o esbanjar de dinheiros públicos na aquisição - frequentemente ilegal - de software.
A ESOP - Associação de Empresas de Software Open Source Portuguesas, fez de um desses contratos exemplo: levou a Câmara Municipal de Almada a tribunal e ganhou. Mas de que serve uma vitória, num caso, se a prática se mantém?
Em 2013, observaram um aumento de 143% no valor destes contratos ilegais. Tinha já, entretanto, entrado em funcionamento o mecanismo de pareceres prévios da AMA. Ainda assim...
Em 2017, numa investigação do Público, chega-se à conclusão que, neste aspecto, nada mudou para melhor. Diz-se, então, que esta prática "deveria merecer uma acção da Comissão Europeia." Hoje fala-se de transição digital, mas sobre isto nada foi feito.
Hoje lembrei-me disto, porque alguém reclamava deste contrato, em que o SNS gasta perto de 300 mil euro em licenças de Office 365. Dir-me-ão que o SNS, agora, não tem alternativa noutro fornecedor. Já estava previsto no manifesto da ANSOL:
"provavelmente dirão que não têm conhecimento de alternativas ou que têm conhecimento mas não têm capacidade para as implementar e gerir. Ou pior, dirão que devido às decisões que eles mesmo tomaram no passado - que os deixaram enredados num esparguete de dependências"
Mas, convém sublinhar, também diz o manifesto das cebolas, "quem paga somos nós", e há alternativa.
Estes milhões são nossos. Até quando estaremos dispostos a esbanjá-los assim?
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